Entrevista ao autor Samuel Pimenta


Samuel Pimenta, jovem autor ribatejano, foi um dos oito escolhidos do "Prémio Jovens Criadores 2012". O escritor natural de Alcanhões, Santarém, foi distinguido na categoria "Literatura" com o poema "O relógio". O texto insere-se na chamada "poesia de intervenção" e soma 13 páginas.
A Biblioteca de Mondim de Basto entrevistou o escritor.


1 - Como foi a tua iniciação na escrita? De que forma a "descobriste"?
Comecei a escrever com a consciência de que queria ser escritor aos 10 anos, mas lembro-me que o que me despertou para a escrita foram os contos de Sophia de Mello Breyner, nomeadamente A Fada Oriana, assim como os clássicos infantis da Walt Disney. Por ter crescido no campo, sempre fui muito ligado à Natureza e, por isso, muito fantasioso. Imaginava mundos secretos para lá dos ramos das árvores, imaginava seres no nevoeiro, imaginava, imaginava, imaginava… Até que, com 10 anos, aventurei-me a escrever o meu primeiro conto, A Casa Assombrada, pois descobri que, com palavras, poderia dar vida a todas as vozes que sentia dentro de mim. Comecei a sentir desde tenra idade que tinha algo a dizer. A escrita surgiu daí, porque tenho algo a dizer, tenho algo a acrescentar ao que já foi dito.

2 - Fala-nos do teu trabalho que foi um dos oito premiados dos "Jovens Criadores 2012".
O poema “O Relógio” é um texto de 13 páginas que se insere na chamada poesia de intervenção. Ao longo do texto, o Eu Lírico faz uma dura crítica à sociedade contemporânea e aos vícios que a controlam, adoptando uma linguagem multidimensional e metaforizando a realidade com a figura do relógio e com o som que ele emite, o tiquetaque sempre igual. Até hoje, foi o poema que me deu mais prazer escrever.

3 - O que significa para ti este prémio?
Este prémio significa muito para mim, tal como acredito que significa muito para os sete escritores que também foram premiados, que aproveito para felicitar. Em início de carreira, é comum depararmo-nos com alguns entraves no mercado editorial. Com este prémio, além do reconhecimento da escrita, há a oportunidade de divulgação do nosso trabalho e de, eventualmente, derrubar algumas dessas barreiras que nos são colocadas. E o concurso em si soa como se, em todas as áreas a concurso, nos dissessem eis os nomes promissores da Arte em Portugal, fiquem atentos, acompanhem-nos. E isso é, indiscutivelmente, excepcional e muito motivador.

4 - Quando será o trabalho editado?
Todas as obras premiadas serão publicadas na colectânea Jovens Escritores 2012, como consta no regulamento do concurso. Penso que, aquando da Mostra Jovens Criadores 2012, algures em Novembro, o livro já estará pronto.

5 - Como surgiu a oportunidade de seres colunista no "Rede Regional"?
Sabia que o projecto estava em crescimento e que precisavam de colaboradores. Enviei para lá um currículo e, passado pouco tempo, fui convidado para integrar o Rede Regional como cronista.

6 - Qual é o tipo de escrita que preferes?
Não posso eleger nenhum tipo de escrita como eleito. Penso que, consoante o que tem de ser escrito, surge o género ideal. O que escrevo em poema só pode ser escrito em poema e o que escrevo em prosa só pode ser escrito em prosa. Comigo, é assim que funciona. Todos os géneros são únicos na sua especificidade.

7 - Quais são os teus autores e livros favoritos?
Bem, são imensos! Gosto muito de Clarice Lispector e da sua obra Perto do Coração Selvagem. José Saramago e a obra Todos os Nomes. Fernando Pessoa e A Mensagem. Os Sermões do Padre António Vieira. Os Lusíadas, de Luís de Camões. Orlando, de Virginia Woolf. O Retrato de Dorian Grey e os Contos de Oscar Wilde. Os Contos de Eça de Queirós. Toda a obra poética de Sophia de Mello Breyner, Florbela Espanca, Carlos Drummond de Andrade, Miguel Torga, Cecília Meireles. Os Irmãos Karamazov, de Dostoiévski. Viagens na Minha Terra, de Almeida Garrett. Toda a obra dramatúrgica de Gil Vicente. E tantos, tantos outros.

8 - Quais são as tuas maiores influências?
Penso que sou influenciado por tudo o que leio. No entanto, as minhas maiores influências de que tenho consciência são Padre António Vieira, Fernando Pessoa, José Saramago, Sophia de Mello Breyner, Florbela Espanca, Eça de Queirós, Clarice Lispector e Dostoiévski.

9 - Portugal "trata bem" a literatura e os escritores? Não sentes falta de oportunidades?
Penso que Portugal pode fazer muito mais pela literatura nacional e lusófona. Basta olharmos as estantes das livrarias para percebermos que é a literatura estrangeira traduzida que tem maior destaque. Mas, pontualmente, lá vão surgindo algumas boas excepções. Os escritores portugueses não podem ser condicionados por lugares cativos nas livrarias nem nos espaços culturais. A arte é uma dádiva ao mundo que o permite manter-se são e inteiro, merece espaços que a promovam de forma isenta e livre.
Quanto a oportunidades… Desde que decidi editar o meu primeiro romance, “O Escolhido”, que retirei do mercado, que tenho aprendido que as oportunidades somos nós que as criamos. Não sou de ficar à espera que as coisas aconteçam e tudo o que tenho conseguido deve-se ao meu trabalho. Se encontro entraves? Imensos. Mas ensinaram-me que a força do acreditar é imensa e, até agora, tem resultado.

10 – Qual é a tua opinião sobre o acordo ortográfico?
Resistirei sempre que puder ao acordo ortográfico. Não alinho em políticas que violam a multiplicidade da Língua Portuguesa.


11 - No mundo atual, quais os papéis das Bibliotecas Municipais?
As Bibliotecas Municipais podem ser a grande alternativa aos círculos que respondem aos critérios do lucro. Penso que a missão das bibliotecas é fomentar na sociedade o gosto pelos livros. Poderia ser feito muito mais nesse aspecto, através de uma maior aproximação à comunidade. Organizem-se mais eventos, convidem-se mais escritores e, acima de tudo, abram-se oportunidades para os artistas que habitam na zona abrangida pelas bibliotecas. Penso que o futuro passa por aí, pela criação de um clima de proximidade entre artistas e comunidade, face à ideia de que quem cria vive sombriamente em torres de marfim. Ainda há muito aquela ideia burguesa de que a cultura tem de ser sisuda e para uma minoria. Dos poetas e escritores que conheço, nenhum deles é sisudo e, quase todos, têm uma boa dose de alegria e loucura na alma. E é disso que o mundo precisa. De pessoas, acima de tudo.

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